Patrícia
era uma das poucas frequentadoras do brechó da dona Rosa. Patrícia
era uma daquelas jovens que gastava seu dinheiro todo com livros e
quando lembrava que deveria cobrir suas vergonhas era tarde demais.
Daí recorria ao templo das roupas, como era conhecido o brechó de
dona Rosa.
Mário
gostava de conversar com a moça, pois podia retirar-lhe algumas
ideias detetivescas das várias literaturas que Patrícia lia. E
quando Mário voltou da confusão no centro de Nova Iguaçu e do
quebra-quebra com os traficantes de aves, resolveu descansar em sua
poltrona. Enquanto descansava pode ver a silhueta de Patrícia
passando em frente a sua porta e subindo para o brechó de dona Rosa.
Deu
um salto da poltrona e subiu as escadas atrás da jovem leitora.
Quando chegou à porta do brechó viu Patrícia futucando uma arara
de roupas do século passado. Rosa o viu e o cumprimentou.
Aproximou-se de Patrícia e perguntou se poderiam trocar umas ideias.
Ela confirmou com um sorriso e uma piscada, coisa que ela sempre
fazia para o detetive.
Do
outro lado da cidade, numa bela mansão da Barra da Tijuca, Aurélio
tomava café enquanto lia o jornal. Aurélio era o marido de Lady K e
mantinha o matrimônio com a bela dama como uma forma de vingança.
-
Kátia, temos um compromisso hoje muito importante. - Disse o velho
sem tirar os olhos da seção de economia do jornal.
-
Não vou. - Respondeu a bela de forma seca. Ela sabia que sua negação
era irrelevante, mas fazia questão de deixar bem claro sua vontade.
Era como a única forma dela combater a opressão do velho
milionário.
-
Quero que você vá com aquele vestido vermelho. - A exigência de
Aurélio revelava o desprezo dele sobre a sua vontade.
-
O vermelho? Por quê, o vermelho? Para aqueles velhos ficarem
babando? Você gosta disso, não? Sente prazer, não é? Mesmo
sabendo que todo mundo sabe que não existe amor entre nós, mas você
gosta de ostentar sua escrava, não? - Kátia agora tinha uma postura
irônica e corajosa.
-
Sim, isso mesmo. Gosto de mostrar a todos que você é minha escrava,
meu brinquedinho. E isso não é culpa minha, meu amoreco. Isso é
culpa de sua ambição. Já lhe disse que pode ser livre, mas sem
minha grana. Você mesmo sabe que é melhor ser escrava milionária
que livre pobretona. - Dizia isso com prazer e dava uma gargalhada no
final.
-
Não quero ir. - Agora a sua voz era de súplica. Esse tipo de
conversa acontecia sempre e seguia do mesmo jeito.
-
Eu sei, mas preciso de você lá. Alguns japoneses importantes
estarão presentes e preciso que eles venham para o meu lado. -
Aurélio precisava da aliança de uma grande empresa japonesa para
manter-se no controle de sua empresa. A presença de Kátia era
sempre positiva. Poucos homens resistiam ao seu encanto e no desejo
de não perder contato com a bela, homens importantes eram
influenciados a manter seus negócios com Aurélio.
-
Que horas? - Enfim, Kátia capitulava.
-
Às 10 horas. Vamos jantar na casa do Diniz. - Respondia Aurélio
tirando os olhos do jornal e lançando um sorriso de vitória.
Em
Nova Iguaçu, Mário conseguira levar a jovem Patrícia até sua
sala. Ele sentou-se em sua poltrona oferecendo o sofá para a jovem.
-
Quer beber alguma coisa? Tenho cerveja. - Oferecia o detetive.
-
Não, Mário. O que você quer de mim? Preciso ver umas roupas com a
Rosa, tô sem grana. - Respondia com aquela irritação dos jovens.
-
Olha só, me ajuda numas coisinhas e você poderá comprar roupas de
verdade e não esse lixo que a Rosa vende. - Mário ensaiava um tom
enigmático.
-
Ah, Mário, você sabe que não ligo pra essas coisas de griffe.
Gosto dos “lixos” que a Rosa vende. Outra coisa, se ela souber
que você acha isso das roupas dela, ela te mata, velho abusado! -
Patrícia sabia de como Mário funcionava, mas se a ajudinha pudesse
lhe render alguma grana, bem que ela poderia utilizar seus dons
literários para ajudar o inculto detetive.
-
Ah, foda-se a Rosa. Olha só Patrícia, tô com uma dona cheia da
grana. Tô com um caso grande, grana forte, garota. Porra, tinha
arrumado uma secretária, mas a louca sumiu. Tô precisando de uma
assessoria, entende? - Mário falava sem parar para não deixar a
jovem pensar.
-
Que caso grande é esse? É coisa perigosa? - Inquiria preocupada
Patrícia.
-
Não. Coisa grande, mas tranquila. E você só será minha assessora,
entende? Coisa chique, menina. - Mário também sabia como Patrícia
funcionava. Ele sabia que ela era atraída pelos enigmas, suspenses,
investigações. Ele sabia que ela adorava as histórias de Sherlock
Holmes.
-
Tá, OK. Vou te ajudar com isso. Olha, pode me arrumar um trocado? -
Patrícia arriscou.
-
Beleza. Toma aqui cem paus, OK? E isso é só o começo, garota. Vá
curtir o fim de semana e na segunda-feira esteja aqui às oito, tá
bom? - Mário sabia que a tinha fisgado.
-
Tá bom. Agora deixa eu ir lá na Rosa. Até segunda, Mário. - A
menina pulou do sofá e sumiu escada acima.
Durante
o jantar na casa do Diniz, Kátia conversava com um grupo de
japoneses sorridentes. Aurélio conversava com Diniz explicando suas
manobras de como trazer a gigante japonesa para o lado deles.
-
Eu conheço sua estratégia, Aurélio. Ela se chama: Kátia. - Diniz
gargalhava.
-
Sim. Tenho que aproveitar ao máximo meu investimento, não? Kátia
pensou que conseguiria enrolar um velho como eu. - Dizia Aurélio com
ar triunfante.
-
Aurélio, conselho de amigo. Tome cuidado com essa moça. Uma mulher
é sempre misteriosa. Você não tem medo dela estar armando alguma
para você? - Aconselhou Diniz.
-
Que nada, Diniz. Kátia é uma matutona, nasceu para ser usada. -
Zombava o velho enquanto bebia seu Johnnie Walker.
-
OK, você sabe o que faz. - Encerrou Diniz.
A
bela Lady K conseguira se ver livre dos japoneses que agora
conversavam alegremente com Aurélio e Diniz. Lady K driblou o
grupinho das senhoras milionárias e se camuflou entre as vastas
plantas do terraço da mansão. Olhava o céu negro e estrelado da
caótica cidade maravilhosa. Sentiu saudades de casa. Pensou em Mário
e sorriu. “O que aquele velho gordo safado deve estar fazendo?”
Pensava consigo mesma a bela mulher.
Mário
resolveu dormir em sua sala. Assistia a um filme antigo quando bateram
em sua porta. Levantou-se com dificuldade e na escuridão não
conseguiu identificar se era mulher ou homem. Abriu a porta.
-
Porra, Soraya, onde você se meteu?